GOLD RUSH – Ouro não sobe: o dólar é que cai
- Carlos Honorato Teixeira

- 9 de out.
- 4 min de leitura
Há mais de um século, o ouro é o termômetro silencioso da economia mundial. Ele não grita, não faz lobby, não promete nada. Apenas observa. E, ao observar, expõe — com brutal clareza — o declínio do dinheiro moderno.
Coloque o gráfico de longo prazo do ouro na sua frente. De 1920 até hoje, o metal “subiu” cerca de 15.000%. Uma valorização de 160 vezes. Mas isso é uma falácia. O ouro não subiu. O que despencou foi o poder de compra das moedas.
O ouro parado e o dólar em queda livre
Uma onça de ouro hoje compra o mesmo terno de um bom alfaiate que comprava há dois mil anos. Isso quer dizer que o ouro, em essência, não se valoriza — ele preserva valor. O que muda é o quanto de papel precisamos para comprá-lo.
O gráfico que parece exibir o ouro em alta, na verdade, deveria estar de cabeça para baixo. Porque ele retrata o colapso contínuo do dólar — e, por consequência, de todas as moedas fiduciárias.
O que vemos é o mesmo padrão que se repete há 5.000 anos: toda moeda vai a zero. A diferença é que, nesta era, a velocidade da destruição é digital.
O fim do lastro e o início do colapso

Até 1933, os Estados Unidos tinham um padrão-ouro. Um dólar correspondia a uma fração fixa de ouro físico. Mas, ao longo da Grande Depressão, o governo desvalorizou a moeda — e revalorizou o ouro. De US$ 21 passou para US$ 35 por onça.
Em 1971, Richard Nixon rompeu de vez o vínculo. O dólar deixou de ter lastro em ouro e passou a se sustentar apenas em fé — fé no governo americano e na sua promessa de pagamento.
De lá para cá, o dólar perdeu 99% de seu valor em relação ao ouro. Falta só 1% para chegar a zero — o mesmo destino que todas as moedas fiduciárias já tiveram.
Do padrão-ouro ao padrão-dívida
O que nasceu em 1971 foi um novo regime monetário: o padrão-dívida. Um sistema em que a riqueza é criada não pela produção, mas pela emissão de crédito. Desde então, o mundo passou a crescer à base de endividamento.

Governos imprimem, bancos multiplicam, consumidores financiam. Tudo parece funcionar — até que o ciclo se inverte.
Hoje, com dívidas recordes, déficits estruturais e uma economia mundial sustentada por liquidez artificial, o colapso não é uma possibilidade remota. É uma necessidade matemática.
Os ciclos dourados: dois séculos de euforia e correção
O relatório recente do Bank of America (“Two hundred years of golden booms and busts”) mostra que o ouro segue um padrão histórico cíclico: longos períodos de estagnação seguidos por explosões de valorização.
Desde 1825, observamos ondas que se repetem:
+156% durante a febre do ouro do século XIX
+454% no pós-Segunda Guerra
+428% na crise dos anos 70
+285% nos anos 2000
+278% desde o fundo de 2015
Cada ciclo marca um mesmo fenômeno: o colapso relativo do dinheiro em papel frente ao dinheiro real da natureza.
A era das moedas em colapso
Depois que os Estados Unidos e a Europa congelaram os ativos russos em 2022, uma mudança silenciosa começou no sistema monetário global.Os bancos centrais entenderam o recado: reservas em dólar podem ser confiscadas.
Desde então, vem ocorrendo uma migração lenta e constante — das reservas em dólares para reservas em ouro.
Nos anos 1990, Reino Unido, Suíça, Canadá e Noruega venderam quase todo o seu ouro, justamente no fundo do ciclo. Agora, os países do BRICS e do Oriente estão comprando tudo que podem.
O motivo é simples: o ouro não pode ser congelado por sanções
.
Do papel para o real
Hoje, apenas 0,5% dos ativos financeiros globais estão em ouro.Os bancos centrais, juntos, possuem cerca de 36.000 toneladas — equivalentes a US$ 3,8 trilhões. Curiosamente, o mesmo valor de mercado de uma única empresa americana: a Microsoft.
Essa comparação é simbólica: mostra o abismo entre o mundo dos ativos reais e o dos ativos inflados por liquidez e especulação.

O gráfico da relação Dow Jones / Ouro, reforça essa tese: sempre que a relação atinge picos, o sistema financeiro entra em crise.A previsão atual é que o índice volte para uma razão inferior a 1:1, o que significaria, por exemplo, Dow Jones a 10.000 pontos e ouro a US$ 20.000 — ou Dow Jones a 25.000 e ouro a US$ 50.000.
Não é o ouro subindo. É o sistema financeiro implodindo.
O ouro como verdade incômoda
O ouro não é um investimento — é um seguro contra a insanidade dos governos.Não promete dividendos, não rende juros, não depende de política monetária.É apenas o que é: valor intrínseco, escasso, universal e imune a promessas quebradas.
Como disse Voltaire em 1728, “o dinheiro de papel sempre retorna ao seu valor intrínseco: zero.”
O ouro, ao contrário, é o único ativo que atravessou impérios, guerras, hiperinflacionamentos e resetes monetários — e permanece o mesmo.
A transição que já começou
Estamos vivendo o início de um novo Gold Rush.Não aquele das minas da Califórnia, mas o da consciência.Enquanto o público olha para os gráficos de ações e criptomoedas, os bancos centrais do mundo estão reconstruindo silenciosamente o lastro da próxima era.
O futuro pode não ser dourado — mas será medido em ouro. Ouro não sobe.O ouro apenas mostra o quanto o dinheiro caiu.E, quando o dinheiro cai, quem entende o valor real da escassez não busca lucro — busca sobrevivência.


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